Irandhir Santos: “Me sinto cooperando para uma ressignificação do mundo”
Entrevista // Irandhir Santos: “Me sinto cooperando para uma ressignificação do mundo”
Por André Dib
Desde a última quinta-feira o ator pernambucano Irandhir Santos interrompeu os ensaios nos estúdios da Rede Globo, no Rio de Janeiro, para estar em Petrolina e Juazeiro. Lá ele participa dos ensaios para a microssérie “Meu pedacinho de chão”, baseado em texto de Benedito Rui Barbosa e dirigido por Luís Fernando Carvalho, e que deve estrear ainda este ano. Aqui, ele recebe homenagem no 7º Vale Curtas hoje à noite, antes da exibição de “Tatuagem”, de Hilton Lacerda, em que Irandhir brilha como nunca no papel de Clécio, líder de uma trupe teatral anarquista, que teima em existir em plena ditadura militar.
É curioso olhar para a singularidade desta situação: no momento em que Irandhir aumenta sua presença na televisão – na última segunda-feira sua imagem foi transmitida nacionalmente em dois programas do horário nobre (“Amores Roubados” e “Tropa de Elite 2″), ele recebe homenagem de um festival de cinema, que ao longo da semana exibiu filmes emblemáticos, onde Irandhir mostra toda a sua potência e sofisticação. Não bastasse, durante o festival foi anunciado que seu mais novo filme, “A história da eternidade”, de Camilo Cavalcante, foi selecionado e será exibido semana que vem no Festival de Roterdã, na Holanda.
Na terra onde gravou “Amores Roubados” e filmou “A história da eternidade” Irandhir recebeu abraços, deu autógrafos, posou para muitas fotos e, em encontro especialíssimo com o público, conversou por quase duas horas, após sessão de “Febre do Rato”, de Cláudio Assis. Na entrevista a seguir, onde fala sobre suas primeiras referências, na juventude em Limoeiro, cidade do interior onde cresceu, sobre convicções políticas e como lida com a nada repentina e muito merecida fama.
Antes de estudar teatro, que atores te impressionavam?
Televisão no interior era algo muito forte, e grandes atores como Lima Duarte e Paulo Gracindo emocionaram a mim e minha família. Cinema demorou a entrar na minha vida, em Limoeiro tinha apenas um, chamado de Cinema da Praça, que fazia exibições esporádicas. No Natal, me lembro de filmes alguns filmes clássicos, em preto e branco e de assistir filmes do Mazzaropi. Por iniciativa da escola, a ideia era trabalhar o personagem do caipira para a escola, na aula de português e de artes. Me liguei na brasilidade do Mazzaropi, era algo próximo. Para mim cinema era coisa muito de fora e vi ali uma aproximação. O tempo que ele estabelecia e o ritmo para suscitar o riso são elementos que me marcaram, além da musicalidade e a sonoplastia. Foi uma abertura com todos os elementos, mas a ligação emocional foi com a questão do ator. Em Limoeiro também havia dois grupos de teatro e um deles montava textos de Ariano Suassuna. A primeira montagem que assisti foi “O Santo e a Porca”, do grupo Leonarte. Lembro do quanto o palco me afetou, os atores me fascinaram, quis participar daquele grupo.
“Febre do Rato”, “O Som ao redor” e “Tatuagem” formam uma sequência de filmes muito definidos em suas convicções. Você acredita no cinema forma de se afirmar politicamente?
Não só acredito como é um fator determinante das minhas escolhas. Toda arte é política, revela sua posição diante do mundo e por isso deve ser uma preocupação do ator. Sei das dificuldades, dos não-apoios, da falta de reconhecimento, mas não podemos abrir mão de algo central, que é o atrelamento a uma postura política, principalmente num mundo onde o ator pode ser elevado a categoria de semideuses e portanto inspira formas de viver, influencia pessoas.
Sua expansão do cinema para a TV pode ser vista como uma bela resposta ao movimento contrário, em que atores e a própria estética da TV está tomando conta do cinema nacional. Como o cinema pode contribuir para tornar a TV melhor?
O cinema vem para contribuir com a reeducação do olhar, para melhorar a apreensão de obras. Para mexer em algo estagnado, propor novos olhares, reflexões. Espero contribuir para que mais culturas sejam vistas, sotaques aceitos, para que se perceba a expansividade que é nosso país, heterogêneo, eclético.
Após quase dez anos atuando no cinema independente, ultimamente você está bastante presente na TV, um dos filmes em que você atua (“O Som ao Redor”) foi o indicado brasileiro ao Oscar, outro estará na semana que vem no festival de Roterdã. Como você pensa essa superexposição?
Sinto isso mais no comportamento das pessoas, para mim é tranquilo porque isso vem através de projetos e obras com as quais me empenhei e sinto cooperando para uma ressignificação do mundo, que para mim deve ser o papel do ator. Quando vem a superexposição fico feliz, porque sei que o está sendo mostrado reflete a essa minha posição.
Fonte: http://valecurtas.wordpress.com/
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