Em última entrevista ao UOL, Wilker apontou erros em políticas culturais
Por: Carlos Minuano
Nader/Divulgação
O ator e diretor José Wilker discursa na abertura do Festival Cine PE 2013
O ator, diretor e crítico de cinema, José Wilker (morto no dia 5), seria homenageado na 18ª edição do Cine PE, festival de cinema em Recife (PE), onde, em abril de 2013, concedeu uma última entrevista exclusiva ao UOL. A ocasião marcava sua estreia na direção com a comédia "Giovanni Improtta", no qual também atuou.
Na edição deste ano, que será realizada entre 26 de abril e 2 de maio, a homenagem ao ator, que participou de mais de 60 filmes, estava marcada para o dia 2, com presença confirmada de Wilker.
O tributo permanece, explica Alfredo Bertini, diretor do festival, mas com ajustes. "O foco não será o mesmo, até porque o sentido de algumas surpresas planejadas se revelaria com sua presença no palco. Estamos, mudando a homenagem, que agora ganha uma configuração póstuma, lamentavelmente", diz. Na ocasião, será exibido um vídeo produzido pelo Canal Brasil.
Crítico ferrenho dos descaminhos da produção cinematográfica brasileira, na entrevista concedida em 2013 Wilker falou sobre a invisibilidade do cinema nacional e de como sucessivos equívocos de políticas culturais promovem a permanência desse cenário. "Não acredito nas boas intenções das autoridades, elas em geral servem a objetivos político-partidários bem imediatos", disse.
Leia a seguir trechos dessa conversa que não chegaram a ser publicados
UOL - Você vê relação entre as recentes políticas culturais e a invisibilidade do cinema nacional?
José Wilker - Eu particularmente não acredito nas boas intenções das autoridades, elas em geral servem a objetivos político-partidários bem imediatos. Quando se editou a Lei Sarney, o que aconteceu? Promoveu o Sarney mais que qualquer coisa. Aí vem o Collor e diz o seguinte: "a lei Sarney tem que ser eliminada por que favorece a corrupção". Traduzindo é: se o boi tem carrapato, mata o boi.
Por que ele fez isso, em sua opinião?
Porque a classe artística não o apoiou, mas não o apoiou assim, claramente. Então ele se vingou extinguindo a Embrafilme, o Concine, a Lei Sarney (A Fundação do Cinema Brasileiro e o Ministério da Cultura também foram extintos, todos em 1990). E aí criou a Lei Rouanet, lei tão complicada na origem que exigiu professores de lei Rouanet. E criou junto com isso outra coisa grave, que é o chamado captador.
Por que a figura do captador é grave?
Porque é a única pessoa que ganha nesse sistema todo. Se você precisa de R$ 1, ele ganha 20%. Se você precisa de R$ 100 mil, ele ganha 20% desses R$ 100 mil. Mais seja com um ou com cem, se o seu projeto não se viabiliza, ele já ganhou a parte dele. Eu estou falando de coisinhas, mas há uma sucessão de equívocos na construção das leis de incentivo.
E isso em sua opinião gera mais distorções?
O resultado disso é incentivar a produção e ter criado um sistema que proporciona a produção de filmes de forma tal que a gente não precisa mais da lei para produzir filmes. A gente pode produzir filmes sem leis (de incentivo fiscal), mas o que acontece é que as majors usam honesta e corretamente esse artificio em beneficio próprio. Ou seja, um dinheiro que já era perdido passou a ser recuperado (por meio de artigo da Lei de Audiovisual ,que estimula coproduções). Temos todo um arcabouço de leis que favorece a produção de filmes, mas não existe nenhuma iniciativa para equipar o país para consumir esses filmes.
Você vê uma elitização das salas de exibição?
Tem uma quantidade imensa de equipamentos de audiovisual desassistida, e abriu salas onde? Na zona sul do Rio de Janeiro. E então você está proibindo 70% da população da cidade de ver cinema e liberando isso para uma elite de 10 a 15%. Nós comemoramos de repente grandes acontecimentos no cinema, falamos assim: "esse ano chegamos a vender 100 milhões de ingressos". Mas foram 100 milhões de ingressos no total, cinema nacional e estrangeiro. Isso é o quanto os americanos vendem no fim de semana. Nós temos menos salas que Manhattan, que é um bairro de Nova York.
Você já teve uma experiência grande de direção na TV, como foi dirigir cinema?
É bem diferente. Na televisão você faz dois longas por semana. Se for uma novela, são 240 minutos no ar, são dois longas por semana. "Giovanni Improtta" foram quatro anos de trabalho. É outra arquitetura. É claro que a televisão, pelo tipo de exigência industrial, te dá uma certa prática. É legal, como uma escola pra você ter agilidade, mas o processo é bem diferente.
Qual você gosta mais, agora que tem experiência no cinema?
Eu particularmente gosto do formato fechado mesmo. Digo, para dirigir, cinema, seriado. Novela não sei se eu sou capaz ainda de encarar não. Acho que não.
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